quinta-feira, 12 de abril de 2012

DA CRIANÇA QUE EXISTE EM NÓS




Eu tenho um quadro (30x45) pendurado na parede de meu quarto, à cabeceira de minha cama. É uma ampliação de uma foto minha. Nela, eu estava com sete anos de idade.

Em dois lançamentos de livros meus, para o público infantil, carreguei o quadro comigo, e o coloquei, num cavalete, junto à minha mesa de autógrafos. Sempre quis me mostrar, quando criança, às crianças. Elas me reconhecem na fotografia como se eu fosse uma igual: a escritora que já foi criança, assim como elas. A escritora que se mostra criança, quando era criança. A escritora que hoje escreve para a criança!
Com surpresa, percebi a euforia nos olhos de cada criança ao avistar o quadro. Algumas afirmavam, perguntando:

-          Esta é você, não é?

De fato, o meu semblante na foto me denuncia. Na época, o meu corte de cabelo estava o mesmo de hoje. Partido do mesmo lado e com o mesmo comprimento. Meu rosto, na foto, seria igual ao rosto de minha filha, se acaso eu fosse mãe.

E, agora, depois de ter ficado um bom quarto de hora a olhar este meu quadro, depois de tantas lembranças de minha infância tão querida, percebo o quanto eu e ela somos ainda parecidas.
Olhando para eu mesma, naquele tempo, senti que ela sempre esteve dentro de minha alma. Ela me acompanha por esta minha vida afora, sempre lado a lado. É justo ela, naquela idade, que se mostra a criança que está dentro de mim. É esta que fui, com sete anos de idade, que é a criança que sempre pensei ter guardado junto a mim.
Hoje, conversamos mais demoradamente. Desde que fiz o quadro, não havia demorado tanto tempo a admirá-lo, como hoje. Acho que estávamos devendo uma à outra este papo tão íntimo e pessoal.
Durante quinze minutos, que me pareceram uma vida, eu e ela travamos uma longa conversa. Olhando nos olhos, conseguimos convergir nosso espaço e nele afluímos para as nossas lembranças. Ela me disse o quanto é bom ser criança ainda. E eu lhe segredei o quanto eu gostaria de ainda ser como ela.
Mas acabamos chegando a um ponto comum. Se ela existe em mim, posto que ela seja eu quando era ela, então somos únicas! Eu e ela somos uma, que um dia foi ela e agora sou eu! E continuamos sendo nós mesmas!
É bom se admirar quando criança, neste quadro, e tenho a certeza que ela, ainda criança, sente o quanto é bom se admirar feito adulta. Nós duas somos cúmplices: eu sei de tudo de sua vida, e ela sabe de tudo da minha. Sou a extensão dela, e ela é a intenção daquilo que eu quis ser, um pouco mais tarde.
É maravilhoso estarmos tão juntas, principalmente, à noite, quando ela, à cabeceira de minha cama, vela os meus sonhos que começaram por ela, nos sonhos dela...

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